domingo, 19 de março de 2017

O Início do APH no mundo e a regulamentação exigida no Brasil.

O Início do APH no mundo e a regulamentação no Brasil.


O Atendimento Pré-Hospitalar (APH) teve início há mais de 30 anos na América do Norte e Europa, apresentando notável expansão logo após a Guerra do Vietnã (1962-1973), quando as autoridades norte-americanas perceberam que a atuação de socorristas nos locais de batalha e nos transportes para hospitais reduzia significativamente a mortalidade e aumentava o tempo de sobrevida dos soldados feridos.


O APH caracteriza-se como o conjunto de medidas e procedimentos técnicos que objetivam o suporte de vida à vítima, podendo ser básico ou avançado, estabelecendo-se padrão vital que mais se assemelhe à normalidade, tendo como conceito supremo não agravar lesões já existentes ou gerar lesões que não existiam, bem como transportar a vítima\paciente\ cliente para o centro hospitalar terciário apropriado ou centro de trauma credenciado.


No Brasil, o APH foi regulamentado somente em 1989, devido ao surgimento oficial do serviço de atendimento às emergências médicas – resgate na cidade de São Paulo, sendo inicialmente desenvolvido segundo os moldes norte-americanos e operacionalizado prioritariamente pelo Corpo de Bombeiros. No final da década de 1990, tendo como pano de fundo interesses do Conselho Federal de Medicina, passou-se a questionar os serviços de APH do Corpo de Bombeiros operados por “socorristas”, até então carentes de embasamento legal para a atuação.

A partir desse período, ocorreu a inserção da categoria médica nos serviços de APH, cabendo, segundo a Resolução nº1.529/98 ao Corpo de Bombeiros e outros militares somente a atuação breve no Suporte Básico de Saúde. A Resolução nº. 1.529/98 determinou, ainda, que a regulação dos serviços de APH seria de competência médica, estabelecendo quais profissionais estariam aptos a atuar no APH (oriundos e não oriundos da área da saúde), bem como a formação necessária para esses profissionais, delimitando, inclusive, o conteúdo curricular para cada categoria. Frente a esse quadro, o Conselho Regional de Enfermagem do Estado de São Paulo, através da Decisão 001/2001 de 22 de março de 2001, regulamentou as atividades de enfermagem no APH e demais situações relacionadas com o suporte básico e avançado de vida resolvendo que “o Atendimento Pré-Hospitalar, de Suporte Básico e  Avançado de Vida, em termos de procedimentos de Enfermagem, previstos em lei sejam, incondicionalmente, prestados por Enfermeiros, Técnicos de Enfermagem ou Auxiliares de Enfermagem, observados os dispositivos constantes na Lei nº 7498/86 e Decreto-lei 94.406/8”. Em 12 de julho de 2001, no intuito de legitimizar as atividades de enfermagem no atendimento Pré-hospitalar, o Conselho Federal de Enfermagem, através da Resolução nº 260/2001, fixa como especialidade de Enfermagem e de competência do enfermeiro o atendimento pré-hospitalar, sem, no entanto, especificar sua formação e ações.

Somente em 2002, através Portaria nº 2048 do Ministério da Saúde, de 05 de novembro de 2002, que regulamenta e normatiza o APH, são definidas as funções do Enfermeiro, o perfil desse profissional bem como de toda a equipe que deve atuar nesse serviço. Nessa Portaria os enfermeiros de APH são responsáveis pelo atendimento de enfermagem necessário para a reanimação e estabilização do paciente, no local do evento e durante o transporte. Cabe também ao enfermeiro, “prestar serviços administrativos e operacionais em sistemas de atendimento pré hospitalar, supervisionar e avaliar as ações de enfermagem da equipe no atendimento pré hospitalar móvel, dentre outras funções específicas. 

No que se refere ao perfil do profissional enfermeiro que atua no APH, a Portaria nº 2048(9) orienta que deva ter iniciativa, estar preparado para trabalhar em conjunto com a equipe; tomar decisões rápidas, embasadas em conhecimentos prévios e protocolos de atendimento, sendo essas últimas fundamentais para o sucesso da ação. Além disso, a referida portaria faz alusão também a algumas características psíquicas desse profissional. Menciona que o autocontrole e equilíbrio emocional são fundamentais para agir sob pressão e estresse; pois muitas ações são realizadas em ambientes perigosos com pouca iluminação ou espaço. O atendimento pré-hospitalar regulamentado e assegurado por lei, teve como consequência a expansão de oferta de trabalho incluindo o enfermeiro nessa área, a qual passou a absorver a mão-de-obra deste profissional. Atualmente se exige do enfermeiro de APH, além de sólida base de conhecimentos técnicos específicos, outros fatores de igual importância, como a capacidade física e Resiliência. Frente ao exposto, percebe-se a exigência de características e habilidades específicas do enfermeiro para atuar em APH. Esse fato é preocupante principalmente quando se verifica que o conhecimento relativo ao APH especificamente, não está integrado no conteúdo das disciplinas curriculares dos cursos de enfermagem e quando tem alguma matéria no curso, não é suficiente para deixar o profissional apto.

 Atualmente existem no mercado vários cursos que visam desenvolver as técnicas utilizadas no APH, e ainda colocar o enfermeiro frente a situações inesperadas, tais como o Advanced Cardiac Life Suport (ACLS), Advanced Trauma Life Support (ATLS), Préhospital Trauma Life Suport (PHTLS), Basic Life Sport (BLS), MAST (Manobras Avançadas De Suporte Ao Trauma), alguns destes cursos não suprem a necessidade de formação específica do profissional para o Atendimento Pré-Hospitalar, pois, na maioria das vezes, desenvolvem os conteúdos em salas de pronto-socorro, onde existe o suporte tecnológico para o atendimento como equipamentos, profissionais treinados, materiais específicos, exames subsidiários, o que nem sempre retrata a realidade do ambiente pré-hospitalar. 

A pouca atenção dada à formação do enfermeiro para atuar em urgências e emergências talvez seja reflexo do próprio sistema de ensino de enfermagem no Brasil, que adota um modelo de ensino e pesquisa de influência norte americana, o qual segue uma visão integralista. Voltado para as políticas de extensão de cobertura e de atenção primária em saúde, nesse contexto, a formação do enfermeiro generalista centra o ensino nas competências das diversas áreas de atuação do profissional, ou seja, capacita o enfermeiro para a assistência individual e coletiva dirigida à criança, mulher e adulto, nas áreas de enfermagem clínica cirúrgica-obstétrica, ginecológica, pediátrica, psiquiátrica e administração hospitalar e dos outros serviços básicos. Além disso, na maioria dos cursos de enfermagem, há grande preocupação em oferecer muita informação, em detrimento da formação e do desenvolvimento das capacidades de trabalhar com essa informação. 

Pode-se inferir então que há algumas lacunas no que se refere à formação de enfermeiros para atuação no APH, pois, de um lado tem-se a legislação apontando a necessidade de um profissional de APH especialista em sua área de atuação com experiência e competência; e de outro lado há formação de enfermeiros generalistas, oriundos de universidades que procuram atender as exigências de um modelo integralista de assistência. Talvez esse cenário, se constitua hoje num grande desafio na formação de enfermeiros para atuarem no APH. Não se quer dizer aqui que a universidade deva desviar seu foco. O que se procura é conhecer o contexto de trabalho no qual se encontra o enfermeiro de APH, tendo como referência o seu preparo para a atuação, frente ao conhecimento sobre APH recebido durante a sua formação profissional. Muitas universidades ofertam pós graduação em APH, mas não completam o curso com estágios práticos, não capacitando completamente o aluno.

Algumas regiões do pais, para entrar no SAMU, são realizados concursos e quando acontece a efetivação do funcionário ao quadro, é realizado treinamento prático, o que capacita o profissional a atuar em APH. Outras regiões, fazem contrato e encaminha os funcionários para empresas que qualifica profissionais em APH.
Qualquer que seja o modelo utilizado, irá capacitar o profissional em APH, nos protocolos atualizados, o que não impede de vermos muitos profissionais de APH, desqualificados, sem preparo físico, sem comprometimento com o paciente. O ideal é sempre que houver um contrato ou concurso de profissionais para atuar com APH, seja realizado uma seleção com profissionais multiprofissionais, para avaliar físico, psicológico e clinico. Só assim teremos profissionais qualificados para atuar no atendimento.

REFERENCIAS: 

1. Brasil. Conselho Federal de Medicina (CFM). Resolução 1529/98 de 28 de agosto de 1998. Disponível em: <http://www.saude.sc.gov.br/resolução>.

2. São Paulo. Conselho Regional de Enfermagem (COREN). Decisão COREN/SP.DIR-01-2001: Dispõe sobre a regulamentação da assistência de enfermagem em atendimento pré-hospitalar e demais situações relacionadas com o suporte básico e suporte avançado de vida. Disponível em: <http://www.aph.com.br>.

3. São Paulo. Conselho Regional de Enfermagem (COREN). Lei n. 7498 de 25 de junho de 1986 do Conselho Federal de Enfermagem (BR). Dispõe sobre a regulamentação do exercício da enfermagem, e dá outras providências. In: C O R E N / S P. Documentos Básicos de Enfermagem: Enfermeiros, Técnicos, Auxiliares. São Paulo: COREN/SP, 2001. pp. 36-41.

4. BRASIL. Decreto nº 94.406, de 08 de junho de 1987. Regulamenta a Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da enfermagem, e dá outras providências. Conselho Regional de Enfermagem da Bahia – Bahia – investindo na qualidade, Salvador, 1999.

5. Brasil. Conselho Federal de Enfermagem (COFEN). Resolução COFEN Nº. 260/2001: Fixa as Especialidades de Enfermagem. [citado em: 2005 set 09] Disponível em: <http://www.corensp.org.br/resolucoes/Resolucao260.htm>.


6. Brasil. Ministério da Saúde (BR). Portaria nº. 2048/GM de 05 de nov. 2002: Regulamento Técnico dos Sistemas Estaduais de Urgência e Emergência. [citado em: 2005 nov 11]. Disponível em: <http://www.saude.gov.br/samu>.