RESPIRAÇÃO: HIPÓXIA ANÓXIA
O homem é o único animal capaz de sobreviver em todos os pontos do globo terrestre, graças a sua capacidade de fabricar vestimentas, abrigos, armas e meios de locomoção que vão desde um trenó até um avião. Os demais animais têm seu “habitat” em determinadas regiões do planeta, ao passo que o homem, fez do planeta seu “habitat” e tanto nasce e vive no Saara como nos pólos.
Incentivado e motivado por esta conquista dirigiu suas atenções para o alto e, há ± 200 anos alçou-se aos céus em balões. Há 90 anos um objeto mais pesado que o ar, o avião, elevou voo e há 35 anos conquistamo s o espaço.
Com o advento do avião o homem passou a exercer atividades em um meio totalmente diferente daquele em que estava adaptado, e não podendo levar com ele seu casulo fisiológico, tratou de desenvolver condições que lhe permitissem arrostar a adversidade do meio conquistado, e a Medicina Convencional, que cuidava de alterações da Fisiologia em um meio normal, passou a se preocupar em evitar alterações da Fisiologia em um meio anormal. Assim estava criada uma nova especialidade médica para estudar, ma nter e corrigir alterações do homem em condições hipobáricas que, inicialmente chamou-se Medicina de Aviação, depois Medicina Aeronáutica e, finalmente Medicina Aeroespacial.
Sabemos que todas máquinas usam combustível e que sem a presença do Oxigênio, elemento componente do triângulo do fogo, não há queima de combustível. A máquina humana, a mais perfeita e silenciosa de todas não funciona sem oxigênio.
Todos sabemos que, na mistura gasosa que constitui o ar, a proporção do Oxigênio mantém-se sempre a mesma, desde o nível da superfície terrestre até o nível cm que se desenvolve a atividade aérea, mesmo com aviões “HIGH PERFORMANCE e que representa cerca de 1/5 do total. Nessa mistura gasosa em que, além de outros gases, existe o Nitrogênio é Importante a presença do vapor de água.
A mistura gasosa chamada ar exerce pressão sobre tudo o que rodeia, inclusive o organismo humano, a qual não é percebida por ser exerci da em todas as direções.
Esta pressão corresponde a de uma coluna de mercúrio com 760 mm de altura conforme demonstrou Torricelli e esta pressão, que é a que se tem ao nível do mar, é denominada Pressão Atmosférica.
A 18.000 pés tem-se o correspondente a 380 mm de Hg/cm’ Ou seja !/2 atmosfera.
A 34.000 pés tem-se o correspondente a 190 mm de Hg/cm’ ou seja ¼ de atmosfera.
A 63.000 pés todos os líquidos de nosso organismo entrarão em ebulição e. se não estiver com proteção especial, o homem ferverá.
A respiração humana compõe-se de dois principais tempos, a inspiração e a expiração. O primeiro tempo é ativo e o 2° passivo, isto é, a inspiração requer esforço para promover a expansão da parede torácica e abaixamento do diafragma, o que cria um vácuo intratorácico e. como a natureza detesta espaços vazios, a pressão atmosférica empurra o ar para o interior dos pulmões que se expandem para ocupar o espaço da cavidade torácica. Relaxando-se o esforço inspiratório o ar volta para o meio exterior, expulso dos pulmões pela volta a posição anterior da parede torácica e do diafragma.
Normalmente, respira-se de 6 a 8 litros de ar por minuto, quantidade essa que varia em função de circunstâncias várias, como estado emocional, exercício etc.
Medições realizadas durante a 2 Guerra Mundial revelaram que os artilheiros das B5 1 chegavam a inspirar de 50 a 60 litros por hora.
A inspiração conduz o ar até o interior dos alvéolos pulmonares cuja superfície total corresponde a ± 80 m², onde se dão as trocas gasosas isto é, o oxigênio passa do alvéolo para a hemácia e o bióxido de carbono sai da hemácia, passa para o interior do alvéolo e é expirado sendo lançado ao meio exterior.
Para que os senhores possam compreender melhor este mecanismo imaginem um túnel fantasma de um parque de diversões em cuja plataforma as pessoas embarcam naqueles barquinhos, dão a volta em todo circuito e, ao voltar, desembarcam na plataforma.
As pessoas, na ida são o oxigênio e na volta o CO2 e os glóbulos vermelhos do sangue (chamados de hemácias) são os barquinhos.
Estas trocas gasosas somente são possíveis porque, além dessa enorme superfície de (80 m²) dos alvéolos, eles tem paredes muito finas, porosas e úmidas e são permeáveis ao oxigênio que vai, empurrado pela sua pressão parcial e a existência de um diferencial de pressão, entrar nos capilares (vasos sanguíneos extremamente finos) por onde vai, através a corrente sanguínea, chegar a todos os tecidos do organismo e aí o oxigênio sai da hemácia dando lugar para o C02 que volta aos pulmões para ser expelido.
O oxigênio inspirado, combina-se com a hemoglobina (pigmento vermelho) da hemácia formando a Oxihemoglobina que é a transportadora do oxigênio aos tecidos e, para que os processos vitais se processem em sua plenitude, a saturação da Hemoglobina pelo oxigênio é de 95% o que corresponderia a 1 litro de oxigênio para 5 litros de sangue.
Outra maneira de explicar este mecanismo sem ter que usar somente termos técnicos é imaginar que os tecidos são uma obra, que os alvéolos são o depósito de material da firma responsável pela obra, que as hemácias são caminhões, o oxigênio o cimento e o C02 o entulho.
Assim, as hemácias se carregam com oxigênio nos alvéolos, levam -no à obra, descarregam e trazem o C02 para o depósito da firma, que providencia sua remoção.
Nos tecidos orgânicos (obra) a pressão é mais baixa o que permite que o oxigênio saia dos capilares (caminhões) e neles seja colocado o entulho (C02).
Lembrem-se que 95% de saturação é o ideal para o organismo e também que a pressão total de 1 mistura gasosa é igual a soma das pressões parciais dos gases componentes dessa mistura.
159,6 mm de Hg/cm2 é a pressão parcial de oxigênio necessária para manter saturação de 95%.
A 10.000 pés a pressão parcial do oxigênio diminui e temos urna satu ração de 02 na hemácia em torno de 90% e a 18 000 pés será de 70% o que é insuficiente para manutenção adequada do funcionamento do cérebro.
Além desta, outras causas como perda de glóbulos vermelhos por hemorragias e anemia podem contribuir para a diminuição da oferta de oxigênio aos tecidos razão pela qual comissárias em período menstrual, poderão sentir-se desanimadas e mais cansadas do que normalmente durante voos.
Substâncias químicas como medicamentos, álcool, gases e vapores tóxicos além do fumo também podem agravar os problemas de falta de oxigênio tissular por diminuir a capacidade da hemácia, ocupando o lugar a ser ocupado pelo oxigênio.
O álcool e outras substâncias químicas produzem intoxicação e bloqueio ao nível dos tecidos, capazes de impedir a liberação de oxigênio para uso dos tecidos. Isto ajudará a compreender porque a bordo o estado de se miembriagues surge mais rapidamente, pois, há hipoxia relativa, soma-se a intoxicação.
O Monóxido de Carbono tem capacidade de combinar-se com a hemoglobina, cerca de 200 a 300 vezes maior do que a do oxigênio, forma-se então a Carboxihemoglobina em lugar da oxihemoglobina, e tem-se intoxicação celular.
A remoção do Monóxido de Carbono da hemácia para deixar o “caminhão” livre para o oxigênio é muito difícil e necessita-se respirar Oxigênio a 100% durante 30-40’ para conseguir-se. Ê por esse motivo que os fumantes tem cerca de 50% menor capacidade de formar Oxihemoglobina e seu organismo quando a 10.000 pés de altura comporta-se como se estivesse a 15.000 pés.
A diminuição de oferta de oxigênio aos tecidos, no interior das aeronaves, embora dentro dos limites em que o organismo consegue compensá -la. é real e seus efeitos se fazem sentir sobre tripulantes e passageiros, com maior ou menor intensidade dependendo do fator individual.
De todos os tecidos, os que mais rapidamente demonstram sofrimento são os constituintes dos órgãos da visão e, a 5.000 pés, já existe discreta diminuição da assim chamada visão noturna.
A partir de quatro horas de permanência a urna altitude de cabine correspondente a 8.000 pés tem-se morosidade intelectual, diminuição dos reflexos. Lassidão, fadiga e início de alterações da capacidade de julgamento.
As pessoas excitadas, atemorizadas ou que querem aumentar a quantidade de oxigênio pelo aumento da frequência respiratória caem na chamada hiperventilação, o que pode vir a ser perigoso, pois, quando se aumenta a frequência respiratória na tentativa de obter-se mais oxigênio, sendo sua pressão parcial baixa, tem-se excessiva eliminação de Dióxido de Carbono (C02) que é quem controla o ritmo respiratório através mecanismo neuroquímico.
Os sintomas decorrentes desta hiperventilação são tonteiras, escotomas (manchas escuras na visão) e dormência de extremidades. A continuação levará a quadros mais sérios.
O controle destes casos faz-se conscientizando as pessoas, esclarecendo-as e ensinando-as a respirar mais lentamente Se necessário pode-se dar-lhes um saco para que respirem (inspirem e expirem) dentro do mesmo.
Nos exercícios físicos ha um aumento da frequência respiratória mas isto e automático, está sob o controle do organismo e tem como finalidade eliminar maior quantidade de CO2 para promover maior captação de Oxigênio. A tentativa de aplicar este princípio a bordo é falha pois o ambiente é pobre em Oxigênio.
Fonte: Dr: Murillo de O. Vilela, Sindicato Nacional dos Aeronautas, Secretaria de Saúde
Fisiologia da Atividade Aérea